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Nacionalidade portuguesa:

o que pode vir em 2018 (parte 2).

Projeto de lei n.º 390/XIII pretende alterar profundamente o quadro normativo para nascidos em Portugal, cônjuges e conviventes, e mesmo imigrantes sem residência legal.

Em todos os casos, movimento é de abertura e facilitação. 

Idioma: PT-BR

Lei de Migração brasileira

Projeto n.º 390/XIII é dos mais revolucionários no campo da nacionalidade: pretende estabelecer o critério jus soli para nascidos em Portugal, tornar quase automática a aquisição para cônjuges e conviventes, e permitir naturalização para imigrantes irregulares. Regulamento dos emolumentos também é objeto de mudanças.

Por Julian Henrique Dias Rodrigues, do gabinete de direito internacional e comparado do Dias Rodrigues Advogados (27/2/2018).

Na segunda parte do nosso informativo sobre projetos de lei afetos à Lei da Nacionalidade portuguesa, sintetizaremos as pretensões do Projeto n.º 390/XIII, apresentado pelo Bloco de Esquerda no dia 27 de janeiro de 2017 (clique aqui para consultar o primeiro artigo da série).

Dos cinco projetos a serem analisados, talvez seja este o mais radical, vez que cria hipóteses extremas de expansão e abreviação dos períodos hoje exigidos para a atribuição ou aquisição da cidadania portuguesa.

FILHOS DE ESTRANGEIROS, NASCIDOS EM PORTUGAL

De acordo com a lei hoje em vigor, resumidamente, os filhos de estrangeiros que nascem em Portugal não têm direito à nacionalidade portuguesa originária, exceto se pai ou mãe tiver residência legal no país há pelo menos cinco anos (art. 1.º, n.º 1, alínea f, da Lei n.º 37/81).

 

Com isto, em princípio, não são portugueses originários os filhos de imigrantes ilegais que tenham nascido em território português (pedimos venia para usar o termo "ilegais" quando nos referimos aos imigrantes indocumentados, ou objetivamente, que não dispõem da competente autorização de residência). Esta situação deu origem ao slogan "quem nasce em Portugal é português", defendido por associações de imigrantes.

É este slogan que o projeto pretende transformar em lei, fixando o chamado critério jus soli pelo qual aquele que nasce em Portugal passa a ser considerado português de origem.

O projeto critica frontalmente os atuais critérios relacionados à ascendência (jus sanguinis), e afirma que "é da mais elementar justiça o reconhecimento do direito à obtenção da nacionalidade do país onde se nasce, independentemente da nacionalidade dos seus progenitores e demais ascendentes.".

Reforçando argumentos de natureza sociológica, o PL assenta que "não há hoje qualquer razão para que os filhos de imigrantes, que aqui nasceram e aqui cresceram, que aqui frequentaram a escola, que aqui construíram todas as suas redes de sociabilização e que muitas vezes não têm qualquer ligação com o país de origem dos seus progenitores, vejam limites à concessão da nacionalidade portuguesa". Valerá como prova o assento de nascimento (altera-se sensivelmente o art. 21, n.º 1 da Lei).

De fato tem causado algum desconforto no seio social as situações em que indivíduos "nascidos e crescidos" em Portugal não têm reconhecida a nacionalidade portuguesa, mas sim a do país de origem dos progenitores, onde jamais colocaram os pés.

No contexto atual, a saída para estes indivíduos tem sido a naturalização prevista no art. 6.º, n.ºs 2 e 5 da Lei (por aquisição, modalidade não originária), que em resumo, exige do requerente a conclusão do 1.º ciclo do ensino básico em Portugal, ou a permanência habitual no país nos dez anos anteriores ao pedido. 

Se aprovado, o PL n.º 390 dará um fim a estas situações. 

CÔNJUGES E CONVIVENTES: AQUISIÇÃO IMEDIATA E FIM DA NECESSIDADE DE RECONHECER JUDICIALMENTE A UNIÃO DE FACTO

Pelo atual texto em vigor, quem é casado ou mantém união estável (união de facto) com português precisa aguardar o prazo de três anos para pedir sua nacionalidade por naturalização.

 

Abrindo aqui um parêntese, as mudanças no Regulamento da Nacionalidade operadas em 2017 fizeram com que muitos se confundissem ao afirmar ser de cinco anos o prazo, quando na verdade, o prazo permanece sendo trienal: o que mudou é que a união ou casamento que perdure por pelo menos cinco anos dispensa o requerente de provar os "laços de efetiva ligação à comunidade portuguesa".

Fato é que mesmo o prazo de três anos poderá fazer parte do passado já que o PL, em uma abertura bastante inovadora, pretende simplesmente eliminar qualquer prazo, bastando uma declaração formal registrada na constância do matrimônio.

Quem também poderá ser profundamente beneficiado com a mudança é o convivente em união de facto, a união estável segundo a nomenclatura brasileira.

 

Pelas regras hoje vigentes, o convivente também se sujeita ao prazo de três anos, mas precisa ainda ter a união reconhecida perante a justiça portuguesa, via ação de reconhecimento em Portugal ou no Brasil (neste último caso, a sentença precisa ser homologada perante um Tribunal da Relação português, percurso custoso e demorado).

Se aprovado, o PL acabará com todas estas exigências: o estrangeiro em união de facto com nacional português pode adquirir a nacionalidade portuguesa mediante a apresentação de declaração de reconhecimento da união de facto emitida pela junta de freguesia.

O procedimento simplificado perante a Junta de Freguesia tem razão de ser, e contempla um grande porém: a Lei de Proteção das Uniões de Facto (Lei n.º 7/2001), em seu art. 2.º-A, estabelece que a prova da união de facto por declaração emitida pela junta de freguesia deve ser acompanhada de declaração de ambos, "sob compromisso de honra", de que vivem em união de facto há mais de dois anos, e de certidões de cópia integral do registo de nascimento de cada qual. 

 

Ou seja, os conviventes não precisarão mais provar judicialmente que convivem há pelo menos três anos, mas é um pressuposto lógico da declaração perante a Junta que convivam há, no mínimo, dois anos

FILHOS ADOTADOS

Tal como no PL n.º 364/XIII, pretende-se fazer uma pequena atualização no art. 5.º da Lei, que trata da aquisição da nacionalidade pelos filhos adotados. Troca-se a expressão "adoção plena" por apenas "adoção", já que o procedimento de adoção em Portugal hoje reveste de uma única modalidade (para saber mais, consulte a primeira parte do informativo).

 

Em termos práticos, o ponto não traz qualquer novidade: é mesmo uma mera atualização que visa adaptar o texto da lei ao atual quadro normativo aplicável à adoção.

IMIGRANTES IRREGULARES, ILEGAIS OU INDOCUMENTADOS: NATURALIZAÇÃO INDEPENDENTE DA SITUAÇÃO PERANTE O SEF

Aos imigrantes que não têm qualquer ascendência nem não são casados ou convivem com português, via de regra, resta o caminho da naturalização (procedimento de aquisição, não originária). Pelas atuais regras, o prazo é de seis anos, mas neste período são contabilizados apenas os anos de residência legal.

Noutras palavras: aquele que passa anos em busca da regularização perante o SEF só terá iniciado o prazo de seis anos no momento em que finalmente tiver em mãos sua autorização de residência. Com isto, há imigrantes que têm levado bem mais do que dez anos de residência efetiva no país para tornarem-se portugueses naturalizados.

Por mais revolucionário que possa parecer - e por maior que seja o alvoroço que tal informação poderá causar - é isso mesmo que o PL pretende extinguir: passa-se a contar o período de efetiva residência no país, pouco importando se de forma legal ou ilegal (regular ou irregular, segundo o politicamente correto). Em resumo, retira-se do art. 6.º, n.º 1, alínea b, a menção à "residência legal", passando a constar apenas e tão somente "residência".

Caso o projeto seja aprovado neste ponto, passará a valer como marco inicial da contagem do prazo a data em que o imigrante chegou ao país e passou a nele viver com intenção de residir habitualmente, sendo irrelevante a sua situação perante o SEF.

 

EMOLUMENTOS: UMA REDUÇÃO CONSIDERÁVEL

Atualmente os emolumentos pagos às Conservatórias nos processos de atribuição, aquisição ou perda de nacionalidade, variam entre €150, €175, €200 e €250, ressalvados os casos de gratuidade aos adotados e menores. Por meio de alterações ao art. 18 do Regulamento Emolumentar dos Registos e Notariado (Decreto-Lei n.º 322-A/2001), o PL pretende equiparar os emolumentos ao valor exigido para a emissão do cartão de cidadão: apenas €15.

Uma descida vertiginosa.

REGULAMENTAÇÃO e VIGÊNCIA

Dada a amplitude das alterações, o PL surpreende ao estabelecer um prazo de 30 dias para que o Governo promova as competentes alterações no Regulamento da Nacionalidade (Decreto-Regulamentar n.º 237-A/2006). Não bastasse o prazo exíguo para regulamentação, prevê o projeto que as alterações entrarão em vigor no dia seguinte à sua publicação no Diário da República.

TRAMITAÇÃO

Como já repetido, o projeto aqui analisado se soma aos quatro outros PLs que compõem o grupo de trabalho de alterações à Lei da Nacionalidade, e que seguem tramitação conjunta no parlamento.

Tal como ocorreu com o PL n.º 364/XIII, foi aprovado no dia 3 de fevereiro de 2017, por unanimidade, o requerimento de baixa à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, sem votação, mediante intervenção do Bloco de Esquerda.

No dia 30 de junho de 2017 foram requisitados os pareceres da Procuradoria-Geral da República, do Conselho Superior da Magistratura e da Ordem dos Advogados portugueses (OA).

Esta última entidade até o momento não entregou suas considerações; os magistrados responderam com a afirmação de que nada têm a aditar, e o Ministério Público, pela PGR, deu sustentação constitucional ao PL ao dizer que "do ponto de vista jurídico e constitucional as alterações propostas não suscitam, salvo melhor opinião, especiais comentários, situando-se no domínio das opções políticas em matéria de definição de quem deve considerar-se nacional português". Entretanto, o MP criticou a alteração no valor dos emolumentos, pois para entidade não se pode equiparar a complexidade da análise de um pedido de nacionalidade à da emissão de um cartão de cidadão.

No dia 12 de dezembro de 2017 foi realizada uma audição com o Instituto dos Registos e Notariado (o IRN).

A partir dela, analistas políticos e juristas em geral têm considerado que as mudanças para cônjuges e conviventes, imigrantes irregulares, e relacionadas os emolumentos, poderão sofrer forte resistência ao longo do processo legislativo, devido ao fato de que as Conservatórias do Registo Civil atualmente têm trabalhado com pessoal insuficiente para analisar o grande volume de pedidos que surgiram após a mais recente alteração no Regulamento, relacionada à atribuição para netos nascidos no estrangeiro.

O pouco rigor nos novos critérios tem sido apontado também como um fator de discordância entre os grupos políticos que decidirão o futuro do PL.

As mudanças atinentes aos nascidos em Portugal, porém, vêm ganhando força, apesar dos temores de quem sustenta que poderá surgir o chamado "turismo do nascimento", comum nos países que adotam o jus soli.

 

Frentes parlamentares ligadas aos movimentos de defesa dos imigrantes há tempos têm buscado solidificar a noção de que "quem nasce em Portugal é português", como referido no slogan, o que tem levado muitos a apostar que neste ponto, o projeto tem maiores chances de ser aprovado.

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Até lá!

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