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  • Processo n.º 07445/11

TCAS: Cinco mil euros de danos morais por morte de cavalos em feira municipal

Na iminência da entrada em vigor do Estatuto dos Animais, o caso dos cavalos eletrocutados na Feira de Maio de Azambuja entrou na pauta dos magistrados do Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS).

O incidente aconteceu nos dias 28 e 29 de maio de 2005, quando decorria o Campeonato Nacional Sénior de Horseball, e foi causado por fios elétricos expostos e em contato com a estrutura metálica das boxes. Ficou provado que o Município não realizou inspeção prévia no local destinado aos animais, embora tenha se comprometido a zelar pela logística e segurança do evento.


Foi reconhecida a responsabilidade civil extracontratual do ente público, com menção à culpa na forma do art. 487, n.º 2, do Código Civil. Na falta de outro critério legal, a culpa é avaliada "segundo a diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso", diz o dispositivo.


Os danos materiais foram avaliados em 10.000 euros, cabendo ao Município complementar o valor já pago pela seguradora. Os danos morais foram fixados na sentença em 5.000 euros, mantidos no acórdão do TCAS.


Na quantificação do dano moral, a questão da ligação afetiva entre animal e proprietário foi objeto de análise.


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​Reportando-se à sentença, o acórdão - relatado pelo Juiz Desembargador José Gomes Correia - fez constar que existia entre cavaleiros e cavalos uma enorme ligação emocional, fruto dos anos de treino necessários à prática do Horseball, cabendo a indenização não-patrimonial diante da gravidade das circunstâncias, nomeadamente a forma abrupta e inesperada como os equídeos morreram.



Para rejeitar o pedido de redução apresentado pelo Município, o acórdão repetiu antigas palavras do STA, no sentido de que “é mais que tempo de se acabar com miserabilismos indemnizatórios".


A decisão foi tomada por unanimidade no dia 30 de março, onze anos e dez meses depois do episódio. O processo deu entrada no então Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa, em 9 de Março de 2006.


 


I)- Para que ocorra responsabilidade civil extracontratual do estado e demais pessoas colectivas públicas por actos ilícitos ou culposos dos seus órgãos ou agentes, no exercício das suas funções e por causa delas, é necessária a verificação cumulativa dos seguintes pressupostos: facto ilícito, culpa, dano e nexo de causalidade adequada entre o facto e o dano.

II) - O montante da indemnização por danos não patrimoniais deve ser fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção o grau de culpa do agente, a situação económica do lesante e do lesado, e as demais circunstâncias do caso (arts. 494.° e 496,°, n,° 3 do C. Civil).

III) - A equidade pode, desde que as circunstâncias do caso concreto o justifiquem, limitar ou suavizar os efeitos de um julgamento envolvendo uma aplicação integral da lei positiva: o sistema jurídico confere à equidade um papel flexibilizador do rigor do Direito positivo, habilitando a derrogação aplicativa das suas soluções normativas, substituindo-as por decisões mais conformes à justiça do caso concreto.

IV) – Todavia, a possibilidade de os tribunais julgarem segundo a equidade não lhes confere uma habilitação para decidir em termos ajurídicos ou arbitrariamente contra lei expressa: o recurso à equidade não é, nem se pode reconduzir à arbitrariedade pois o uso da equidade encontra sempre o seu fundamento numa norma legal, isto significa que mesmo os casos de decisão contra legem ainda correspondem a uma vontade expressa pelo legislador: decidir contra legem em nome da justiça do caso concreto ainda é aplicar a lei que manda ou permite submeter o julgamento de certo tipo de litígios à equidade.

V) - O juízo de equidade das instâncias, essencial à determinação do montante indemnizatório, em casos como o dos autos, assente numa ponderação, prudencial e casuística, das circunstâncias do caso – e não na aplicação de critérios normativos – deve ser mantido sempre que – situando-se o julgador dentro da margem de discricionariedade que lhe é consentida - se não revele colidente com os critérios jurisprudenciais que, numa perspectiva actualística, generalizadamente vêm sendo adoptados, em termos de poder pôr em causa a segurança na aplicação do direito e o princípio da igualdade.

VI) - Mas, nas concretas circunstâncias dos autos, ponderado o relevo e efectividade dos danos, a sua natureza, sempre delicada e problemática, levam-nos a concluir que os valores cujo conhecimento e fixação se diz terem sido indevidamente conhecidos, não se afastando dos padrões jurisprudenciais que temos por correctos, não merece censura.

VII) – É que, estando em causa a fixação do valor da indemnização por danos não patrimoniais, necessariamente com apelo a um julgamento segundo a equidade, o tribunal de recurso deve limitar a sua intervenção às hipóteses em que o tribunal recorrido afronte, manifestamente, as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas e de criteriosa ponderação das realidades da vida.

VIII) – E tem vindo a afirmar-se a jurisprudência no sentido de que tal como escapam à admissibilidade de recurso «as decisões dependentes da livre resolução do tribunal» (arts. 400º., n.1, al. b), do CPP e 679. do CPC), em caso de julgamento segundo a equidade, devem os tribunais de recurso limitar a sua intervenção às hipóteses em que o tribunal recorrido afronte, manifestamente, aquelas regras.

IX) - Para adensar mais o problema, temos que a lei não dá qualquer conceito de equidade, mas, tem-se aceite a mesma como a consideração prudente e acomodatícia do caso, e, em particular, a ponderação das prestações, vantagens e inconvenientes que concorram naquele, sendo nesse sentido, é apodíctico que a expressão “em qualquer caso”, constante do artº 496º do CC, tanto abrange o dolo como a mera culpa.

X) - E, por sua vez, “demais circunstâncias do caso” é uma expressão genérica que se pretende referir a todos os elementos concretos caracterizadores da gravidade do dano, incluindo a desvalorização da moeda. Ou seja, na atribuição dessa indemnização deve respeitar-se todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida.

XI) – Mas essa indemnização por danos não patrimoniais, para responder, actualizadamente, ao comando do artº 496º do Cód. Civil e, porque visa oferecer ao lesado uma compensação que contrabalance o mal sofrido, deve ser significativa, e não meramente simbólica, devendo o juiz, ao fixá-la segundo critérios de equidade, procurar um justo grau de “compensação” tendo sempre presente a proclamação antiga do STA no sentido de que “é mais que tempo, conforme jurisprudência que hoje vai prevalecendo, de se acabar com miserabilismos.

XII) - Tendo presente tudo quanto acaba de dizer-se, volvendo ao caso concreto, discordando o recorrente do valor fixado pelo tribunal para os danos não patrimoniais porque o considera desproporcionado, entende este tribunal de recurso que, face às circunstâncias descritas e à “balizas” da equidade que é justo o valor equitativamente adequado de forma a compensar os danos não patrimoniais sofridos pelos recorridos e que correspondem exactamente a metade do valor inicialmente pedido a esse título.


ACIDENTE EM CAMPEONATO NACIONAL SÉNIOR DE HORSEBALL - CULPA IN VIGILANDO - EXCESSO DE PRONÚNCIA - DANOS NÃO PATRIMONIAIS FIXADOS COM RECURSO À EQUIDADE. (Ac. do TCAS de 30 de março de 2017, Rel. José Gomes Correia, Processo n.º 07445/11)

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