STJ: Liberdade de imprensa e direito à honra no contexto da crítica política
"Ocorrendo conflito entre os direitos fundamentais individuais – à honra, ao bom nome e reputação - e a liberdade de imprensa, não deve conferir-se aprioristicamente e em abstracto precedência a qualquer deles, impondo-se a formulação de um juízo de concordância prática que valore adequadamente as circunstâncias do caso e pondere a interpretação feita, de modo qualificado, acerca da norma do art.. 10º da CEDH pelo TEDH (...)".
I. Ocorrendo conflito entre os direitos fundamentais individuais – à honra, ao bom nome e reputação - e a liberdade de imprensa, não deve conferir-se aprioristicamente e em abstracto precedência a qualquer deles, impondo-se a formulação de um juízo de concordância prática que valore adequadamente as circunstâncias do caso e pondere a interpretação feita, de modo qualificado, acerca da norma do art.. 10º da CEDH pelo TEDH - órgão que, nos termos da CEDH, está especificamente vocacionado para uma interpretação qualificada e controlo da aplicação dos preceitos de Direito Internacional convencional que a integram e que vigoram na ordem interna e vinculam o Estado Português - e tendo ainda necessariamente em conta a dimensão objectiva e institucional subjacente à liberdade de imprensa, em que o bem ou valor jurídico que, aqui, é constitucionalmente protegido se reporta, em última análise, à formação de uma opinião pública robusta, sem a qual se não concebe o correcto funcionamento da democracia.
II. Não podem considerar-se ilícitos os artigos de opinião que – embora redigidos de forma mordaz, contundente e desprimorosa, se situam - no cerne do debate e crítica à acção política e governativa, traduzindo essencialmente juízos valorativos profundamente negativos sobre a capacidade e idoneidade política do visado - podendo este escrutínio público envolver a formulação de juízos valorativos claramente críticos e negativos e, consequentemente, implicar prejuízo à imagem do político visado como homem de Estado junto dos eleitores, sem que tal configure ilícita violação de direitos de personalidade.
III. As peças jornalísticas, situadas no âmbito da chamada imprensa cor de rosa, que referenciam e comentam aspectos da vida pessoal e relacionamentos do visado, situadas fora do perímetro da sua actividade política, não envolvem violação do direito à reserva da vida privada quando – como decorre da matéria de facto – o A. sempre tornou públicos aspectos da sua vida privada e familiar, participando abertamente em eventos sociais , concedendo entrevistas, participando em iniciativas e autorizando a publicação de imagens em revistas ditas cor de rosa .
IV. Não geram ilicitude, traduzida em violação ilegítima dos direitos de personalidade, geradora de responsabilidade civil, as notícias, enquadradas em crónica social, em que se referem aspectos factuais que se apurou serem inverídicos ou inexactos – e envolvendo, nessa medida, violação de regras deontológicas do jornalismo - num caso em que ,pela natureza dos factos em questão, tal divulgação não é objectivamente susceptível de afrontar o direito à honra e consideração pessoal do visado.