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  • Processo n.º 1032/15.0T9TBRG.G1

TRG: Defensor nomeado para um acto e a contagem de prazo para apresentação de recurso

I - Por força do disposto nos arts. 66º, do CPP, e 39º, nº 1, e 42º da Lei nº 34/2004, de 29/7, com a alteração introduzida pela Lei 47/2007, de 28/8 (alteração do regime de acesso ao direito e aos tribunais), o defensor nomeado para um acto, enquanto não for substituído, mantém-se para os actos subsequentes do processo, pelo que os sucessivos pedidos de escusa apresentados pelos vários defensores nomeados ao arguido não teriam, legalmente, a virtualidade de interromper o prazo que se encontrava em curso para apresentação de recurso.



II - Todavia, a Sra. Juíza titular do processo aquando do primeiro pedido de escusa formulado e nos demais subsequentes com que renovou o aí decidido, determinou a interrupção do prazo em curso nos termos do art. 34º, nº 2, da Lei nº 34/2004, de 29/07, na redacção da Lei 47/2007, 28/08, e declarou, ainda, que o mesmo apenas se reiniciaria nos termos do art. 24, nº 5 do mesmo diploma, o que foi notificado aos vários defensores nomeados e ao arguido, pelo menos uma vez, tendo este mantido sempre o propósito de interpor recurso da sentença.

III - Acresce que também resulta dos autos que os defensores nomeados pediram a confiança do processo o que lhes foi deferido e que o motivo dessas escusas se prendiam até com o facto de o arguido manter sempre o propósito de interpor recurso da sentença.

IV - Não obstante não ter transitado em julgado, o assim decidido pela Sra. Juíza deve considerar-se consolidado com o apontado erro, para efeitos de interrupção do prazo em curso, e, por consequência, deve reputar-se o recurso de tempestivo, porquanto, à luz do senso comum, dificilmente os cidadãos compreenderiam que os diversos entes e organismos do Estado, neste particular integrados no órgão de soberania tribunais, não se articulassem entre si nos serviços que lhes prestam e para que foram criados.

V - Realmente, o Tribunal – nele incluído, obviamente, a secretaria funcionalmente dependente da respectiva Titular – não teve quaisquer dúvidas de que o prazo de recurso ainda se encontrava em curso, tendo informado o arguido em conformidade, ou seja, de que a sentença não tinha transitado em julgado, enviando cópia da mesma.

VI - Tendo assim procedido, o Tribunal gerou no arguido a legítima expectativa e a fundada confiança de que o prazo para apresentação do recurso se havia interrompido. Ora, as expectativas, legitimamente criadas pelos cidadãos, resultantes de comportamentos dos poderes públicos impõem a previsibilidade da actuação destes, ínsita no princípio do estado de direito democrático (consagrado no art. 2º da CRP), nas suas vertentes dos princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança.

VII - Por isso, incumbindo aos tribunais, no exercício do essencial poder judicial do Estado, assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos (cf. art. 202º da CRP), estes não esperam da parte daqueles, ao administrarem a justiça em concreto, qualquer afronta ao clima de boa-fé e de confiança em que os cidadãos têm o direito de acreditar, na sua relação com todos os poderes públicos.

VIII - Mesmo que a apreciação dos enunciados elementos probatórios, essencialmente documentais, vinculada a um conceito ou a um critério de probabilidade lógica preponderante, não permitisse, com alguma segurança, a conclusão de que o arguido agiu sem dolo, ou seja, que não procedeu à entrega do veículo por querer desobedecer a uma ordem legítima, mas por ter a convicção de que se encontrava a defender o seu direito de propriedade, os mesmos elementos sempre estribariam a ilação de que a afirmação então feita pelo recorrente ao Tribunal, apoiada em documentos, de que era o verdadeiro possuidor do veículo e não o seu mero detentor precário, como depositário, seria, pelo menos, geradora de uma dúvida razoável quanto aos factos do foro psicológico que lhe foram assacados na sentença, a qual teria que ser resolvida em seu benefício, concluindo-se pela sua não culpabilidade. Com efeito, existindo a possibilidade razoável de uma solução alternativa ou de uma explicação racional e plausível diferente, deve a decisão assentar na que se mostre mais favorável ao arguido, de acordo com o princípio in dubio pro reo.


APOIO JUDICIÁRIO - PROCESSO PENAL - NOMEAÇÃO DE DEFENSOR - REGIME DA SUBSTITUIÇÃO -CONTAGEM DO PRAZO PARA RECURSO. (Ac. do Tribunal da Relação de Guimarães, de 20 de março de 2017, Processo n.º 1032/15.0T9TBRG.G1, Rel. Ausenda Gonçalves).

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